quinta-feira, janeiro 29, 2009

Caso com resolução

O negócio jurídico é um conceito jurídico; sendo que os conceitos jurídicos representativos da realidade apresentando-se como conceitos genéricos, pois têm carácter tanto mais abstracto quanto mais compreensivos pretendem ser. Dentro destes entram inúmeros factos voluntários da mais diversa espécie; ora são negócios jurídicos um contrato de compra e venda, ora um testamento, ora um casamento.
Pelo exposto, na análise do conceito genérico se, tomam em conta apenas aqueles elementos do facto que são comuns a todas as figuras específicas compreendidas no género comum. Os elementos essenciais do negócios jurídicos são os elementos que devem sempre verificar-se para que exista qualquer negócio jurídico.
Além destes elementos essenciais, existem espontaneamente elementos essenciais de cada tipo de negócio jurídico, que especificam uns em relação aos outros; elementos estes que devem verificar-se para que um negócio jurídico seja um testamento e não uma compra e venda e não uma doação, etc. Assim, os elementos essenciais de todo e qualquer negócio jurídico são: 1º - a capacidade; 2º - a vontade; 3º - o objecto possível; 4º - eventualmente a forma. Terá que haver lugar também a uma classificação dos negócios jurídicos, isto porque o conceito de negócio jurídico compreende factos voluntários da mais variada espécie.
a) Negócios jurídicos unilaterais e bilaterais ou contratos
O Código Civil contém uma regulamentação geral do negócio jurídico, abrangendo assim as duas modalidades. O critério classificativo é o do número e modo de articulação das declarações integradoras do negócio.
Nos negócios unilaterais, há uma declaração de vontade ou várias declarações, mas paralelas, formando apenas um grupo.
Nos contratos ou negócios bilaterais, há duas ou mais declarações de vontade, de conteúdo oposto, mas convergentes, ajustando-se na sua comum pretensão de reduzir o resultado jurídico unitário, embora com um significado para cada parte.
Acerca dos negócios unilaterais, importa focar as seguintes características:
a) É necessária a anuência do adversário, a eficácia do negócio unilateral não carece de concordância de outrem;
b) Vigora, quanto aos negócios unilaterais, o princípio da tipicidade ou do “numerus clausus”;
c) Deve fazer-se a distinção entre negócios unilaterais receptícios (ou recepiendos), em que a declaração só é eficaz, se for e quando for dirigida e elevada ao conhecimento de certa pessoas; e negócios unilaterais não receptícios, em que basta a emissão da declaração sem ser necessário comunicá-la a quem quer que seja.
Acerca dos contratos, não são integrados por dois negócios unilaterais, pois cada uma das declarações (proposta e aceitação) é emitida em vista do acordo.
A proposta do contrato é irrevogável, depois de chegar ao conhecimento do destinatário (art. 230º CC), mantendo-se durante os lapsos de tempo referidos no art. 228º CC.
Sendo o contrato integrado por duas declarações, põe-se o problema de saber qual o momento da sua perfeição. O problema surge, quanto aos contratos entre ausentes, e tem interesse para efeitos variados. Várias doutrinas abordam a questão: Doutrina da aceitação: o contrato está perfeito quando o destinatário da proposta aceitar a oferta que lhe foi feita; e Doutrina da expedição: o contrato está perfeito quando o destinatário expediu, por qualquer meio a sua aceitação; Doutrina da recepção: o contrato está perfeito quando a resposta contendo a aceitação chega à esfera de acção do proponente, isto é, quando o proponente passa a estar em condições de a conhecer; e , Doutrina da percepção: o contrato só está perfeito quando o proponente tomou efectivo da aceitação.
Do art. 224º do Código Cívil, resulta consagrar o nosso direito à doutrina da recepção, que parece ser aliás, a preferível “de iure condendo”. Não será todavia necessário que a declaração chegue ao poder ou à esfera de acção do proponente, se, por qualquer meio, foi dele conhecida (art. 224º/1).
Desta forma, podemos resumir os negócios jurídicos unilaterais e bilaterais ou contratos como a vontade que preside ao facto dos mesmos serem de uma só pessoa ou de várias, mas com o mesmo conteúdo e direcção; então o negócio jurídico será unilateral; tem uma só direcção, um único lado. Os negócios jurídicos bilaterais são os contratos, nos quais há duas ou mais declarações de vontade, com conteúdo diverso, sobre cuja coordenação, para obter um resultado comum, há acordo ou consenso de ambas as "partes".
b) negócios jurídicos consensuais e formais
Os negócios jurídicos de maior importância ou de maior valor económico só são válidos quando revestem determinada forma. O negócio jurídico produz efeitos jurídicos condizentes com os efeitos pretendidos pela vontade do declarante, ou com o consenso das partes. Mas a declaração unilateral de vontade não basta para a atribuição de efeitos jurídicos, quando a lei exija não apenas a declaração da vontade mas a declaração expressa por certa forma - forma escrita - prestada perante funcionário público e por ele reduzida a escrita (em geral notário).
Os negócios formais ou solenes, também assim denominados, são aqueles para os quais a lei prescreve a necessidade da observância desta determinada forma, do acatamento de determinado formalismo ou de determinadas solenidades. Os negócios não solenes (consensuais, tratando-se de contratos), são os que podem ser celebrados por quaisquer meios declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial, sendo que a lei não impõe uma determinada roupagem exterior para o negócio.
Quando o negócio é formal, as partes não podem realizar por todo e qualquer comportamento declarativo, pois a declaração negocial deve, nos negócios formais, realizar-se através de certo tipo de comportamento declarativo imposto por lei. Hoje o formalismo é exigido apenas para certos negócios jurídicos, é uniforme, manifestando-se praticamente na exigência de um documento escrito, e está assim simplificado, relativamente aos direitos antigos. O princípio geral do Código Civil em matéria de formalismo negocial é o princípio da liberdade declarativa ou liberdade de forma ou consensualidade, de acordo com o exposto no art. 219º do C.C
. que diz que “A validade da declaração negocial não depende da observância de forma especial, salvo quando a lei a exigir”).
Quando, nos casos excepcionas em que a lei prescrever uma certa forma, esta não for observada, a declaração negocial é nula.
Em regra não é de exigir forma especial; os casos em que é exigida são expressos nas leis. A razão da exigência converge na conveniência de evitar dúvidas em assuntos ou negócios de maior gravidade, de evitar a eventual tentação de invocar direitos inexistentes, procurando reconstitui-los com prova imprecisa ou dúbia. Nos negócios consensuais, que são a regra, basta para sua validade que a vontade ou consenso se tenham manifestado exteriormente por qualquer modo (verbalmente).
c) negócios jurídicos no direito das obrigações, nos direitos reais, de família ou sucessões.
Como é observável, os negócios jurídicos são o modo mais incisivo de actuação da liberdade e iniciativa do homem na vida jurídica. Os seus efeitos podem situar-se, no direito privado, em qualquer dos ramos em que foi dividir-se o campo do direito privado: em matéria de obrigações (constituindo, modificando ou extinguindo obrigações), em matéria de direitos reais, de família ou sucessões.
Estes são aqueles tipos de negócios em que se exige, além das declarações de vontade das partes, formalizadas ou não, a prática anterior ou simultânea de um certo acto material.
Assim, o negócio é real, obrigacional, familiar, sucessório, consoante dele resulte a constituição, a modificação ou a extinção de uma qualquer relação jurídica real, obrigacional, familiar ou sucessória. A importância desta classificação resulta da diversa extensão que o princípio da liberdade contratual que reveste em cada uma das categorias, de acordo com o exposto no art. 405º Código Cívil no número 1 “Dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver” e acrescenta no número 2 que “ As partes podem ainda reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei”.) .
Quanto aos negócios familiares pessoais, a liberdade contratual está praticamente excluída, podendo apenas os interessados celebrar ou deixar de celebrar o negócio, mas não podendo fixar-lhe livremente o conteúdo, nem podendo celebrar contratos diferentes dos previstos na lei.
Quanto aos negócios familiares patrimoniais, existe, com alguma amplitude, a liberdade de convenção, conforme o exposto no art. 1698º CC que diz que “Os esposos podem fixar livremente, em convenção antenupcial, o regime de bens do casamento, quer escolhendo um dos regimes previstos neste código, quer estipulando o que a esse respeito lhes aprouver, dentro dos limites da lei”, sofrendo embora restrições nos artigos. 1699º e 1714º do Código Cívil.
Quanto aos negócios reais, o princípio da liberdade contratual sofre uma considerável limitação derivada do princípio da tipicidade ou do “numerus clausus”, visto que “não é permitida a constituição, com carácter real, de restrições ao direito de propriedade ou de figuras parcelares deste direito senão nos casos previstos na lei” (art. 1306º). Só podem constituir-se direitos reais típicos, embora essa constituição possa resultar de um negócio inominado ou atípico.
No domínio dos negócios obrigacionais vigora o princípio da liberdade negocial, quase inconformadamente, quanto aos contratos, abrangendo a liberdade de fixação do conteúdo dos contratos típicos, de celebração de contratos diferentes dos previstos na lei e de inclusão nestes de quaisquer cláusulas (art. 405º CC); quanto aos negócios unilaterais, vigora porém, a princípio da tipicidade (art. 457º CC que diz que “A promessa unilateral de uma prestação só obriga nos casos previstos na lei”).
d) negócios jurídicos onerosos ou gratuitos
Esta distinção tem como critério o conteúdo e finalidade do negócio. Os negócios onerosos ou a título oneroso, pressupõem atribuições patrimoniais de ambas as partes, existindo, segundo a perspectiva destas, um nexo ou uma relação de correspectividade entre as referidas atribuições patrimoniais.
As partes estão de acordo em considerar, as duas atribuições patrimoniais como correspectivo uma da outra. Neste sentido pode dizer-se que no negócio oneroso, as partes estão de acordo em que a vantagem que cada um visa obter é contrabalançada por um sacrifício que está numa relação de estrita casualidade com aquela vantagem. As partes consideram as duas prestações ligadas reciprocamente pelo vínculo da casualidade jurídica.
Os negócios gratuitos ou a título gratuito, caracterizam-se ao invés, pela intervenção de uma intenção liberal (“animus domandi, animus beneficiandi”). Uma parte tem a intenção devidamente manifestada, de efectuar uma atribuição patrimonial a favor de outra, sem contrapartida ou correspectivo. A outra parte procede com a consequência e vontade de receber essa vantagem sem um sacrifício correspondente.
Assim, da perspectiva do interesse que tem o negócio jurídico para o declarante, distinguem-se os negócios jurídicos em onerosos e gratuitos.
Nos negócios jurídicos onerosos, ambas as partes têm interesse na outorga do negócio; com ela beneficiam. Nos negócios gratuitos domina a generosidade de uma parte em benefício da outra.
A transmissão de bens pode realizar-se por compra e venda (oneroso) ou por doação (gratuito); o empréstimo de dinheiro pode ser feito mediante juro ou sem juro.
e) negócios de mera administração e de disposição
Sobretudo no que respeita à administração de bens alheios, à limitação de poderes de representação, etc., tem interesse a distinção entre negócios de mera administração, que correspondem a actos de gestão normal dos bens, (como os relativos à conservação, à frutificação normal dos bens de produção, ou ao seu melhoramento normal).
A utilidade da distinção, está relacionada com a restrição por força da lei ou sentença, dos seus poderes de gestão patrimonial dos administradores de bens alheios, ou de bens próprios e alheios, ou até nalguns casos (inabilitação), de bens próprios, aos actos de mera administração ou de ordinária administração.
Os actos de mera administração ou de ordinária administração, são os correspondentes a uma gestão comedida e limitada, em que estão afastados os actos arriscados, susceptíveis de proporcionar grandes lucros, mas também de causar prejuízos elevados. São os actos correspondentes a uma actuação prudente, dirigida a manter o património e a aproveitar as suas virtualidades normais de desenvolvimento.
Pelo contrário, os actos de disposição são os que, dizendo respeito à gestão do património administrado, afectam a sua substância, alteram a forma ou a composição do capital administrados, atingem o fundo, a raiz, o casco dos bens.
São actos que ultrapassam aqueles parâmetros de actuação correspondente a uma gestão de prudência e comedimento sem riscos, sendo que são todos os que excedem os limites prudentes e os objectivos próprios da mera administração; os mais importantes, mas não os únicos, são ditos de alienação.
É de notar também que existem actos de alienação (do ponto de vista jurídico) que são autênticos actos de administração, como a venda dos frutos, a colocação de mercadorias, etc.

Podemos então concluir que os negócios jurídicos podem ser classificados da seguinte forma:
Quanto à manifestação da
vontade: unilaterais (a declaração de vontade, feita por uma ou mais pessoas, na mesma direcção); bilaterais (duas manifestações de vontade, em sentido oposto, porém há coincidência em relação ao objecto).

Quanto às vantagens: gratuitos (só uma das partes aufere da vantagem); onerosos (ambos os celebrantes possuem ônus e vantagens recíprocas).

Quanto ao tempo em que devam produzir efeitos: inter vivos (destinados a produzir efeitos durante a vida dos interessados); causa mortis (emitidos para gerar efeitos após a morte do declarante).

Quanto à subordinação: principais (são os negócios jurídicos que têm existência própria e não dependem de nenhum outro); acessórios (aquele cuja existência subordina a um outro).
Quanto às formalidades: solenes (são celebrados de acordo com a forma prevista na lei; não solenes (não dependem de forma rígida para sua celebração).
Quanto à pessoa: impessoais (não importa quem sejam as partes); intuitu personae (aquele realizado de acordo com as qualidades especiais de quem o celebra).

E depois de caracterizar aqui a classificação dos negócios jurídicos, torna-se importante clarificar alguns elementos essenciais para que o mesmo possa ter lugar : a capacidade, a declaração de vontade, o objecto possível e eventualmente a forma:
1º) A capacidade
A noção de capacidade já foi estudada a propósito do próprio conceito de personalidade. A capacidade referida aos negócios jurídicos é apenas um aspecto da capacidade jurídica em geral. Pode distinguir-se, portanto, em capacidade de gozo, e capacidade de exercício.
Em geral todos os homens têm a capacidade de gozo quanto a todos os direitos. As pessoas colectivas tê-la-ão relativamente aos actos que directa ou indirectamente interessam à realização dos seus fins, enquanto reconhecidos ou expressos nos seus estatutos.
Ora, se todo o negócio jurídico pressupõe uma declaração de vontade, a capacidade do agente é indispensável à sua participação válida na vertente jurídica; a capacidade especial ou legitimação distingue-se da capacidade geral das partes, para a validade do negócio jurídico, já que, para que ele seja perfeito não basta que o agente seja plenamente capaz; é imprescindível que seja parte legítima, ou seja, tenha competência para praticá-lo, dada a sua posição em relação a certos interesses jurídicos; a sua falta pode tornar o negócio nulo ou anulável; desta formas, a legitimação depende da particular relação do sujeito com o objeto do acto negocial.
A incapacidade de exercício é suprível, como também já acima expliquei, mediante o instituto da representação; nas pessoas colectivas, o exercício dos direitos, e por isso a celebração de negócios jurídicos, cabe aos órgãos representativos das pessoas colectivas.
2ª) A declaração da vontade (Cód. Civil, arts. 217º e segs.)
Uma vontade inexpressa não pode ser entendida por outrém nem produzir efeitos jurídicos. Precisa de ser "declarada", para que constitua direitos ou obrigações em relação ao ou aos destinatários da declaração.
A vontade real do declarante pode não corresponder à vontade declarada.
O legislador tem de tutelar, pois, a boa fé, nas relações jurídicas, e por isso pode ser inválida a declaração da vontade que não corresponda à intenção real de quem a declarou.
Verificando-se uma divergência entre a vontade real e a vontade declarada, há que distinguir os casos em que tal divergência é intencional daqueles em que a divergência não é intencional. Divergências intencionais entre a vontade real e a declarada constituem nas declarações unilaterais de vontade a reserva mental, quando o declarante propositadamente declare coisa diferente daquilo que efectivamente quer, e nos contratos a simulação, quando as partes declaram coisa diversa daquilo que efectivamente pretendem.
A reserva mental não prejudica a validade da declaração da vontade a não ser que aquele a quem é dirigida (declaratário) tenha ele próprio conhecimento da vontade real do declarante, isto é, não esteja de boa fé.
Na coordenação hierárquica dos nossos desejos, é a vontade o primeiro elemento constitutivo do negócio jurídico ou do acto jurídico em sentido estricto. Fenómeno interno e ultra-sensível, penetra normalmente no mundo do direito pela declaração. Mas para que possa modelar efeitos esta tem que ser livre, séria, consciente e também consequente, isto é: emitida com desígnios que o direito reconhece e assegura, fornecendo às relações formadas o elemento da obrigatoriedade; endereçada a um escopo que o direito entenda como digno de tutela; ou seja, apto a produzir determinada alteração no estado de direito preexistente.
Deste modo, a vontade psicológica só se converte em jurídica com o decurso de dois factores que se engrenam numa unidade actual: a vontade real, dirigida a um fim protegido pelo direito; e a declaração do seu prolongamento perceptível que é a manifestação externa realizada para aquele resultado juridicamente relevante .

Essa exteriorização da vontade efectiva, receptícia ou não-receptícia, por sua vez se desdobra em dois outros elementos : A Vontade negocial, também chamada de efeito, de conteúdo ou de resultado, e a Vontade de declarar, que é a decisão de executar o acto mediante o qual a vontade negocial vai chegar ao conhecimento de uma pessoa ou de uma categoria indeterminada de pessoas.
A ausência do elemento comunicativo desqualifica a declaração; não é declaração de vontade. Mas a manifestação declarativa, também denominada "actuação de vontade" é excepcionalmente equiparável na sua eficácia à genuína declaração quando o acto se cumpriu com a intenção de permanecer secreto: por exemplo com o testamentário que, em segredo, destruiu o testamento, ainda que dê a entender aos outros que não o revogou; com o herdeiro que, sem declarar que aceitou a herança, põe-se a consumir ou doar os bens que a compõem; com o consumo sigiloso de mercadoria enviada, a ocupação ou o abandono subretícios, etc.
O acto é tácito quando não é instrumento da manifestação mas do seu indício: por gestos, sinais mímicos inequívocos (levantar ou sentar-se nas votações, alçar o braço ou dedo nos leilões, os sinais marítímos, os de trânsito, etc.); por atitude, comportamento, conduta, factos concludentes e unívocos relacionados com circunstâncias pré-determinadas (o credor de dívida vencida, recebendo juros ulteriores ao seu vencimento, prorrogou o prazo) negatividade, omissão ou silêncio, desde que seja este silêncio circunstanciado e qualificado, com as restrições divulgadas na doutrina alienígena e pátria, pois o silêncio é, em si mesmo, de conteúdo neutro e equívoco e só em casos excepcionais, quando acompanhado de circunstâncias particulares (existência de usos integrativos, preexistência de relações, natureza do negócio) poderão ser interpretado como anuência.


3ª) - Divergência intencional entre a vontade e a sua declaração: a simulação
As partes acordam em emitir declarações não correspondentes à sua vontade real, com intuito de enganar terceiros (art. 240º/1 CC). Esta operação, é uma operação complexa que postula três acordos:
1. Um acordo simulatório: visa a montagem da operação e dá corpo à intenção de enganar terceiros.
2. Um acordo dissimulado: exprime a vontade real de ambas as partes, visando o negócio verdadeiramente pretendido por elas, ou um puro e simples retirar de efeitos ao negócio simulado.
3. O acordo simulado, traduz uma aparência de contrato destinado a enganar a comunidade jurídica.

Na simulação, as partes têm uma única vontade, a vontade simulada, que por definição implica a dissimulada e implica a simulatória. No art. 240º do C.C., solicitam-se três requisitos: Acordo entre declarante e declaratário; No sentido de uma divergência entre a declaração e a vontade das partes; Com o intuito de enganar terceiros.

Todos estes requisitos têm de ser invocados e provocados por quem pretender prevalecer-se no regime da simulação. Este acordo entre declarante e declaratário, é muito importante, até para que se fique prevenido contra uma certa confusão que possa haver do erro e a simulação, ou da reserva mental e da simulação. A divergência entre a vontade e a declaração também surge nesta figura como um dado essencial da existência da simulação. O intuito de enganar terceiros (não confundir com intenção de prejudicar terceiros, porque o que se passa é que haja criação de uma aparência).

4º) - Divergência não intencional entre a vontade e a declaração
O declarante pode enganar-se ao declarar a sua vontade; faz uma declaração de vontade que, por erro, não corresponde àquela que queria dizer.A declaração negocial é então anulável, desde que não afecte essa anulação o interesse do declaratário que esteja de boa fé, ou seja, que não conheça ou não devesse ignorar a essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro (art. 247º do Código Cívil)
O problema da divergência entre a vontade real e a declaração de vontade poderá ter fundamentalmente uma de duas soluções opostas: ou se considera o negócio nulo, se a declaração não corresponde à vontade real do declarante, pois que é a vontade, em si mesma, que importa tutelar, e desse modo se protege o interesse do declarante, que não deve ser obrigado àquilo que realmente não quis; ou se dá sobretudo importância ao interesse geral de todos os possíveis contraentes, à boa fé de terceiros, à segurança no comércio jurídico, e se prefere em consequência o interesse individual do declarante, atribuindo validade à declaração da sua vontade, mesmo que não corresponda à sua vontade real.
Seria essencial no primeiro caso, a vontade real do declarante como elemento essencial do negócio jurídico (teoria da vontade), e no segundo, a declaração da vontade (teoria da declaração).
Não se considera inexistente a vontade, se tiver havido uma declaração divergente da vontade real, se o declaratário não sabia, nem devia saber que a declaração não podia corresponder à vontade real do declarante.
Modalidade importante da divergência não intencional da vontade real e da vontade declarada é a que tem a sua origem na coacção física. Se a declaração é feita por efeito da violência irresistível, não há vontade. E nesta hipótese será levar longe de mais a tutela dos interesses de terceiros no comércio jurídico, atribuindo à total falta ou inexistência de vontade o valor de "vontade"; a declaração é então nula (Cód. Civil, art. 246º).





Depois do exposto, reportemo-nos ao caso apresentado pelo Professor.
Falamos então de Josefino, um rapaz todo bonito e musculado, que faz as delícias de meninas e senhoras, sorriso fácil, dentição perfeita, olhos deslumbrantes, mas um verdadeiro canalha! Tirou um curso de Gestão, pagando casa e propinas, com os vastos lucros resultantes da venda de quadros falsificados a compradores ingénuos!
Em primeiro lugar, o objecto negocial (quadros falsificados) é ilícito, pelo que será sempre um factor passível de anular o negocio, conforme o artigo 280º do Código Cívil, número 1 que diz que “ é nulo o negócio jurídico cujo objecto seja física ou legalmente imposível, contrário à lei ou indeterminável”.
A nulidade dos contratos por imposibilidade legal do seu objecto não se confunde com a nulidade por ilicitude do objecto que é legalmente impossível quando a lei a ele se opuser insuperavelmente, e é ilícito quando violar uma diposição legal.
Não considerando a sua falsidade, a venda de quadros enquadra-se no tipo de negócio bilateral que se reveste no tipo de contratos, nos quais há duas ou mais declarações de vontade, com conteúdo diverso, sobre cuja coordenação, para obter um resultado comum, havendo um acordo ou consenso de ambas as "partes”, já que Josefino tinha compradores que anuiam ao negócio, havendo, ao abrigo do artigo 224º do Código Cívil, eficácia da declaração negocial, através do seu número 1 que diz que “ A declaração negocial que tem um destinatário torna-se eficaz logo que chega ao seu poder ou dele é conhecida; as outras, logo que a vontade do declarante se manifesta na forma adequada”.
Contudo, todo o negócio jurídico pressupõe uma declaração de vontade e a capacidade do agente é indispensável à sua participação válida na vertente jurídica; sendo que a capacidade especial ou legitimação distingue-se da capacidade geral das partes para a validade do negócio jurídico, já que, para que ele seja perfeito não basta que o agente seja plenamente capaz; é imprescindível que tenha competência para praticá-lo, e estes individuos eram ingénuos.
O Significado de ingénuo aponta para
os adjectivos de - natural, em que não há malícia, simples, inocente - sendo que qualquer um dos compradores pode invocar a anulabilidade pois este negócio poderá ser enquadrável como usurário, de acordo com o disposto no artigo 282º , no número 1 que diz que “É anulável, por usura, o negócio jurídico, quando alguém, explorando a situação de necessidade, inexperiência, ligeireza, dependência, estado mental ou fraqueza de carácter de outrem, obtiver deste, para si ou para terceiro, a promessa ou a concessão de benefícios excessivos ou injustificados”, agravando a condição no artigo 284º do Código Cívil ao reflectir-se neste negócio a usura criminosa “Quando o negócio usurário constituir crime, o prazo para o exercício do direito de anulação ou modificação não termina entanto o crime não prescrever; e , se a responsabilidade criminal se extinguir por causa diferente da prescrição ou no juízo penal for proferida sentença que termine em julgado, aquele prazo conta-se da data de extinção da responsabilidade criminal ou daquela em que a sentença transitar em julgado, salvo se houver de contar-se a partir de momento posterior, por força do disposto no n.º1 do artigo 287º”
Mas há mais e podemos considerar ainda que Josefino agiu de má fé e sob a forma de Dolo que, de acordo com o exposto no artigo 253º se entende por “qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário ou terceiro, do erro do declarante”. Ora, conforme ainda o exposto no artigo 227º, no número 1 “ quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.
O principal efeito do dolo é a anulabilidade do negócio (art. 254º/1 CC), mas acresce a responsabilidade pré-negocial do autor do dolo, por ter dado origem à invalidade, com o seu comportamento contrário às regras da boa fé.
A responsabilidade do autor do dolo é uma responsabilidade pelo dano da confiança ou interesse contratual negativo. Em suma: o “deceptus” tem o direito de repristinação da situação anterior ao negócio e à cobertura dos danos que sofreu por ter confiado no negócio e não teria sofrido sem essa confiança. Ao invés, não pode pretender ser colocado na situação em que estaria se fossem verdadeiros os factos fingidos perante ele.
Aliás, ele era tão vigarista, que certo dia vendeu a André um quadro de Schiele que ele pensava ser falso, tendo mais tarde verificado que era o verdadeiro.
Pelo exposto anteriormente, o objecto negocial “supostamente” teria uma condição ilícita pelo que logo à partida o negócio seria anulável, contudo, Josefino chegou à brilhante conclusão que se tinha enganado e que afinal o quadro era verdadeiro, havendo aqui uma divergência não intencional entre a vontade e a declaração, em que o declarante pode enganar-se ao declarar a sua vontade; fazendo uma declaração de vontade que, por erro, não corresponde àquela que queria dizer. A declaração negocial é então anulável, desde que não afecte essa anulação o interesse do declaratário que esteja de boa fé, isto é, que não conheça ou não devesse conhecer a essencialidade do elemento sobre que incidiu o erro (art. 247º) e André não conhecia a falsidade do quadro pensando, pelo que se pressupõe do texto, que o mesmo seria verdadeiro, percebe-se a manifestação, no caso concreto de Josefino, da reserva mental.
Esta configura-se pela presença de seus elementos constitutivos, a saber, emissão de uma vontade contrária à vontade real do declarante e a intenção de enganar o declaratário, caracterizado como um vício do negócio jurídico e levando-se em consideração que não era do conhecimento do declaratário a vontade não exteriorizada (nesse caso o negócio se aproximaria da simulação e seria caracterizado como nulo) considera-se então o negócio como passível de ser anulável.
No Regime das Nulidades, estas operam “ipso iure” ou “ipsa vi legis”, não se tornando necessário intentar uma acção ou emitir uma declaração nesse sentido, nem sequer uma sentença judicial prévia, e podem ser declaradas «ex officio» pelo tribunal, conforme o disposto no artigo 286º “A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal”. Desta forma, são invocáveis por qualquer pessoa interessada, ou seja, pelo sujeito de qualquer relação jurídica que tenha sido afectada, na sua consistência jurídica ou prática, pelos efeitos a que se dirigia o negócio.
As nulidades são insanáveis pelo decurso do tempo, ou seja, são invocáveis a todo o tempo, conforme o disposto no artigo 286º “A nulidade é invocável a todo o tempo por qualquer interessado e pode ser declarada oficiosamente pelo tribunal”. A possibilidade da sua invocação perpétua poderá, porém ser precedida, no aspecto prático, pela verificação da usucapião, se a situação de facto foi actuada de acordo com os efeitos a que tendia o negócio.
As nulidades são também insanáveis mediante confirmação, conforme o disposto no Código Civil pelo artigo 288º, no seu número 1. Pode, contudo, neste caso específico ter lugar aqui um sucedâneo da confirmação: a chamada renovação ou reiteração do negócio nulo.
Existem algumas diferenças entre a confirmação e a renovação, já que a confirmação é um negócio unilateral e a renovação, nos contratos nulos, é um novo contrato. A confirmação tem um efeito retroactivo, mesmo em relação a terceiros, isto porque a renovação opera “ex nunc”, mesmo que o fundamento da nulidade tenha desaparecido, embora, por estipulação «ad hoc», possa ter eficácia retroactiva nas relações entre as partes.
Se as partes renovam o negócio nulo, não se verificando já, obviamente o motivo de nulidade (e atribuem eficácia retroactiva à renovação), a retroactividade é apenas obrigacional, ou seja, vincula apenas as partes sem ser oponível perante terceiros.
A renovação pode ter lugar por declaração tácita nos termos gerais do artigo 217º, no número 1 que diz que “ a declaração negocial pode ser expressa ou tácita: é expressa quando é feita por palavras, escrito ou qualquer outro meio directo de manifestação de vontade, e tácita, quando se deduz de factos que, com toda a probabilidade, a revelam”, e acrescenta no número 2 que “ O carácter formal da declaração não impede que ela seja emitida tacitamente, desde que a forma tenha sido observada quanto aos factos de que a declaração se deduz”. Apesar da declaração poder ser tácita, exige-se o conhecimento da nulidade ou dúvidas quanto à validade do negócio.
Transtornado, Josefino exigiu de André a devolução do quadro. Porque este não lhe devolveu o quadro, usou uma faca para lhe exigir a devolução, embora, nem assim o conseguiu!
Josefino usou assim de coacção moral, e diz-se coação moral o procedimento do coactor que infunde no espírito do coagido fundado temor de dano iminente e considerável à sua pessoa, à sua família, ou aos seus bens. A coação moral, abandona o trajecto da simples ameaça, e poderá evoluir para a violência física, consumativa de uso de recurso material para agravar o temor à vítima, transformando-se em coacção física. Se a violência foi apenas moral, limita ao campo da ameaça, sem que se utilize força, e será por isso coacção moral, conforme o disposto no artigo 255º, no número 1 que “diz-se sob a coacção moral a declaração negocial determinada pelo receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração”.
Tanto na coacção física, como na coacção moral, confere-se à vítima uma faculdade que permite a escolha de uma entre duas opções, de fazer ou não a vontade do coactor. O acto celebrado sob coacção é nulo, de acordo com o disposto no artigo 256º sobre os efeitos da mesma “ A declaração negocial extorquida por coação é anulável, ainda que esta provenha de terceiro; neste caso, porém, é necessário que seja grave o mal e justificado o receio da sua consumação” ainda que haja culpa do coagido não há dever de indemnização, e pode incorrer na responsabilidade civil e até penal do coactor, de acordo com o disposto no artigo 246º do Código Cívil “ A declaração negocial não produz qualquer efeito, se o declarante não tiver a consciência de fazer uma declaração negocial ou for coagido pela força física a emiti-la, mas, se a falta de consciência de fazer uma declaração foi devida a culpa, fica o declarante obrigado a indemnizar o declaratário”.
A coacção física não se confunde com a coacção moral, sendo que naquela falta inteiramente a vontade e a sanção é a ineficácia do acto, ou seja, na coacção física ou absoluta, o coagido tem a liberdade de acção totalmente excluída, enquanto na coacção moral ou relativa está cerceada, mas não excluída.
O Código Civil prevê, sob a epígrafe “coacção física” (art. 246º), a hipótese de o declarante ser “coagido pela força física a emitir” a declaração .
Têm-se em vista as hipóteses em que o declarante é reduzido à condição de puro autómato (coacção absoluta) e não aquelas em que o emprego da força física não chega aos extremos da “vis absoluta”. A coacção física ou absoluta importa, nos termos do art. 246º, a ineficácia da declaração negocial.

Teve mais sorte com o carro: ao tirar a carta, conseguiu que Genoveva lhe “oferecesse” um carro, após ameaçar publicar na Internet umas fotografias íntimas que lhe havia tirado semanas antes.

O Código Cívil, prevê no artigo 70º sobre a tutela geral da personalidade, no número 1 que “ a Lei protege os individuos contra qualquer ofensa ilícita ou ameaça de ofensa à sua personalidade física ou moral”, acrescentando no número 2 que “Independentemente da responsabilidade civil a que haja lugar, a pessoa ameaçada ou ofendida pode requerer as providências adequadas às circunstâncias do caso, como fim de evitar a consumação da ameaça ou atenuar os efeitos da ofensa já cometida”.
No artigo 79º do mesmo código fica expresso o Direito à Imagem, no número 1 que passo a citar “ O retrato de uma pessoa não pode ser exposto, reproduzido ou lançado no comércio sem o consentimento dela (...)” e prossegue no número 3 “ o retrato não pode, porém, ser reproduzido, exposto ou lançado no comércio, se do facto resultar prejuízo para a honra, reputação ou simples decoro da pessoa retratada”. Genoveva tem ainda direito à reserva sobre a intimidade da vida privada, conforme o exposto no artigo 80º,no número 1 que diz que “ todos devem guardar reserva quanto à intimidade da vida privada de outrem”.
Contudo Genoveva foi coagida moralmente a “oferecer” o carro a Josefino, sendo que consta do art. 255º no número 1, a noção de coacção como “receio de um mal de que o declarante foi ilicitamente ameaçado com o fim de obter dele a declaração”. É, portanto, a perturbação da vontade, traduzida no medo que resulta de ameaça ilícita de um dano (de um mal), feita com o intuito de extorquir a declaração negocial.
Só há vício da vontade, quando a liberdade do coacto não foi totalmente excluída, quando lhe foram deixadas possibilidade de escolha, embora a submissão à ameaça fosse a única escolha possível de evitar constrangimentos para o mesmo.
São necessários três elementos, cumulativamente, para que exista coacção moral:
Ø Ameaça de um mal: em que todo o comando do coactor que consta em desencadear o mal ou consiste no mal já iniciado. Este mal pode respeitar á pessoa do coagido (há sua honra) e ao seu património, sendo que pode ainda haver ameaça relevante se respeitar à pessoa, património deste ou de terceiro.

Ø Ilicitude da ameaça: a existência deste requisito vem duplamente estabelecida na lei, nos art. 255º/1 e 255º/3 do Código Cívil, se a ameaça se traduz na prática de um acto ilícito, está-se perante coacção, constitui coacção, o exercício normal do direito (n.º 3).


Ø Intencionalidade da ameaça: o coactor com a ameaça tem em vista obter do coagido a declaração negocial (art. 255º/1 C.C.). Esta ameaça deve ser cominatória, a este requisito da intencionalidade falta o coagido emitir outra declaração que não aquela a que a ameaça se dirigia.

Para que exista moral relevante (coacção anulatória do negócio) é necessário dos elementos referidos, como os requisitos da casualidade ou essencialidade, dupla casualidade, medo (este provocado por coacção moral, esta casualidade apresenta-se num duplo plano, é necessário que o medo resulte da ameaça do mal e por outro lado, o medo causado pela ameaça há-de ser a causa da declaração).
Não é requisito de relevância da coacção a existência de prejuízo para o coagido. No regime de relevância deste vício há que distinguir se a coacção vem do declaratário ou de terceiro (art. 256º CC, à contrario).
A coacção constitui um acto ilícito, geral tal como o dolo.
Verifica-se neste caso a anulabilidade e não a nulidade mesmo que o coacto tenha procedido com reserva mental, ao emitir a declaração que pode ser anulada a pedido do próprio coagido.
A coacção moral origina a anulabilidade do negócio (art. 256º CC) e dá lugar igualmente á responsabilidade pré-negocial do coactor, de acordo com o estipulado no artigo 227º do Código Cívil que refere que “quem negoceia com outrem para conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele, proceder segunda as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”. Verifica-se a anulabilidade, e não a nulidade, mesmo que o coacto tenha procedido com reserva mental, ao emitir a declaração.
Havendo responsabilidade civil fica Josefino obrigado a indemnizar Genoveva nos termos dos arts. 562.º e seguintes do Código Civil. Resulta do n.º 1 do art. 566.º do Cód. Civil, que o legislador deu primazia à reconstituição in natura sobre a indemnização em dinheiro. Deste modo, sempre que seja possível reparar o bem lesado, esta reparação constitui a indemnização.
Assim, por exemplo, no caso de ofensas ao bom nome proferidas em público, a reconstituição in natura pode passar pela obrigação de retractação.
Neste caso em que há violação do direito à intimidade e vida privada cometida através da utilização de fotografias não consentidas, a reconstituição natural poderá consistir na devolução do negativo e respectivas cópias ou na sua destruição. Por exemplo de reparação, no caso da detenção ilícita de cartas missivas, memórias familiares ou outros registos, a sua devolução e, no caso de produção de cheiros ou ruídos insuportáveis, a sua cessação. Todavia, a reconstituição natural pode não ser plena sempre que não conseguir reparar a totalidade dos danos causados. Quando tal acontece, poderá ainda ter lugar uma indemnização pecuniária.
Uma nota para salientar que o direito de indemnização, por ofensas a direitos de personalidade, seja por responsabilidade aquiliana, seja por responsabilidade obrigacional não prescreve nos termos gerais (respectivamente, arts. 498.º e 309.º do Cód. Civil). Com efeito, nos termos do art. 298.º do Cód. Civil os direitos de personalidade são imprescritíveis. Deste modo, «um exercício tardio nunca poderia obstar à sua eficácia. Quanto muito — e verificados apertados requisitos — poderia haver uma indemnização pela confiança criada no seu não-exercício».
Genoveva era casada com Leopoldo. Mas desconfiava que ele já não a amava. Para recuperar o amor dele, resolveu fazer dieta. Para tal, comprou a António uns comprimidos que ele fazia no laboratório farmacêutico onde trabalhava como segurança. Nas duas primeiras semanas, Genoveva perdeu 5 quilos, cumprindo integralmente as recomendações de António. O problema veio na terceira semana, quando faleceu, tendo sido provado na autópsia que a morte resultou do consumo daqueles medicamentos.
Do artigo 483º/1 do Código Civil, decorre que “Aquele que, com Dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”. Neste caso António agia com Dolo.
O dolo tem uma dupla concepção completamente distinta, que pode ser entendida como uma sugestão ou artifício usados com o fim de enganar o autor da declaração (art. 253º/1 CC); ou a modalidade mais grave de culpa que é a contraposta à mera culpa ou também negligência (art. 483º/1 CC).
Em Direito Civil, o que está em causa é a primeira acepção, ou seja, o dolo dá lugar a uma espécie agravada de erro, porque o dolo é o erro provocado.
A noção de dolo consta do art. 253º, no seu número 1 “entende-se por dolo qualquer sugestão ou artifício que alguém empregue com a intenção ou consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração, bem como a dissimulação, pelo declaratário pu terceiro, do erro do declarante”.
Trata-se dum erro determinado por um certo comportamento da outra parte. Só existirá dolo, quando se verifique o emprego de qualquer sugestão ou artifício com a intenção ou a consciência de induzir ou manter em erro o autor da declaração (dolo positivo ou comissivo), ou quando aconteça a dissimulação, pelo declaratário ou por terceiro, do erro do declarante (dolo negativo, omissivo ou de consciência).

A relevância do dolo depende de três factores:
Ø Que o declarante esteja em erro;
Ø Que o erro tenha sido causado ou tenha sido dissimulado pelo declaratário ou terceiros;
Ø Que o declaratário ou terceiro haja recorrido a qualquer artifício, sugestão ou embuste.

Para Castro Mendes, “a relevância do dolo depende de uma dupla causalidade, é preciso que, primeiro, o dolo seja determinante do erro, e que esse erro (segundo) seja determinante do negócio”.

O dolo tem várias modalidades de onde se destacam :
Ø Dolo positivo e dolo negativo, conforme o art. 253º no número 1 do Código Cívil;

Ø “Dolus bonus” e “dolus malus”: só é relevante, como fundamento da anulabilidade, o “dolus malus”. A lei tolera a simples astucia, reputada legítimamente pelas concepções imperantes num certo sector negocial. A lei declara não constituírem dolo ilícito sendo, portanto, “dolus bonus”, as sugestões ou artifícios usuais, considerandos legítimos, segundo as concepções dominantes no comércio jurídico (art. 253º/2 CC);

Ø Dolo inocente, em que há um mero intuito enganatório, dolo fraudulento, há o intuito ou a consciência de prejudicar.

Ø Dolo proveniente do declaratário e dolo proveniente de terceiro: para a relevância do dolo de terceiro, são exigidas certas condições suplementares que devem acrescer às do dolo de declaratário e o seu efeito é mais restrito. Existirá, não apenas dolo de terceiro, mas também dolo do declaratário, se este for cúmplice daquele, conhecer ou dever conhecer a actuação de terceiros (art. 254º/2 CC).


Ø Dolo essencial ou determinante, o enganado (“deceptus”) foi induzido pelo dolo a concluir o negócio em si mesmo e não apenas nos termos em que foi concluído, sem dolo não se teria concluído qualquer negócio; dolo incidental, “deceptus” apenas foi influenciado, quanto aos termos do negócio, pois sempre, contrataria, embora noutras condições.

O principal efeito do dolo é a anulabilidade do negócio (art. 254º/1 CC), mas acresce a responsabilidade pré-negocial do autor do dolo, por ter dado origem à invalidade, com o seu comportamento contrário às regras da boa fé, durante os preliminares e a formação do negócio (art. 227º).

A responsabilidade do autor do dolo é uma responsabilidade pelo dano da confiança ou interesse contratual negativo.

É necessário que exista a verificação cumulativa de cinco requisitos: facto, ilicitude, culpa, dano e nexo de causalidade, os quais condicionam a obrigação de indemnizar o lesante e António por ser segurança e trabalhar “ilicitamente” no laboratório produzindo comprimidos para os quais não teria qualquer habilitação e conhecimento, e ao vender esses mesmos comprimidos, estaria a agir com Dolo, e, de acordo com o estipulado no artigo 483º do Código Cívil, no número 1 “ aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indeminizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.

Existe aqui um facto humano positivo, em que é violado um direito de outrem, neste caso de Genoveva, sendo esse o direito à vida conforme estipula o art. 24º da Constituição da República Portuguesa, no número 1 “ A vida humana é inviolável”.
Assim, observa-se aqui o segundo requisito, a ilicitude, pela qual não há nenhuma causa de exclusão.
Neste caso concreto, o agente – António - agiu com culpa (art. 487º) como já acima foi explicado. Quanto ao dano, este verifica-se, pois como resultado da morte de Genoveva, existe o sofrimento e a dor por parte Leopoldo, denominando-se este de dano moral.
Contudo, para que o dano seja passível de indemnização é necessário existir entre o facto e o dano uma relação de causa-efeito, ou seja, a consequência daquele facto seja aquele dano. No caso concreto, verifica-se nexo de causalidade, de acordo com o art. 563º “ A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”, já que o facto de António lhe fornecer os comprimidos, fez com que Genoveva morresse, daí o sofrimento e dor que o seu esposo sentiu.
Assim, verificam-se todos os requisitos neste caso, logo António tem que indemnizar, segundo o artigo 495º do Código Civil, o cônjuge Leopoldo, devido à morte de Genoveva, sendo também obrigado a indemnizar todas as despesas resultantes de um possível salvamento da vítima e do funeral da mesma.
Ainda assim, segundo o artigo 496º n.º 1 Código Cívil, é de frisar que só há direito à indemnização, uma vez que o dano causado, não é considerado patrimonial. Passando a atender o n.º 2 do mesmo artigo que diz que “por morte da vitima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe, em conjunto, ao cônguge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem” sabe-se que esse direito à indemnização compete apenas a Leopoldo.
A dor por vezes transtorna-nos e irado, Leopoldo, após descobrir os factos, deu três tiros a António: um na perna esquerda, um na perna direita e um terceiro em local não identificado!
De acordo com o artigo 483º “Aquele que, com Dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação”.
A este facto, reporta-se o anterior, em que, para que o dano seja passível de indemnização é necessário existir entre o facto e o dano uma relação de causa -efeito, ou seja, a consequência daquele facto seja aquele dano. No caso concreto, verifica-se nexo de causalidade, de acordo com o art. 563º “ A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”, já que Leopoldo feriu António nas duas pernas e na tal parte desconhecida provindo daí danos que o lesado não teria sofrido.
Assim, verificam-se todos os requisitos neste caso, para que Leopoldo tenha que indemnizar, segundo o artigo 495º do Código Civil, António, devido às lesões que lhe infligiu, e ainda todos os possíveis intervenientes no seu socorro, de acordo com o número 2 do referido artigo que diz que “ neste caso, como em todos os outros de lesão corporal, têm direito a indemnização aqueles que socorreram o lesado, bem como os estabelecimentos hospitalares, médicos ou outras pessoas ou entidades que tenham contribuído para o tratamento ou assistência da vítima”.
Contudo, no artigo 257º do Código Cívil, prevê-se a incapacidade acidental, cujos requisitos dizem que no momento do acto haja uma incapacidade de entender o sentido da declaração negocial ou falte o livre exercício da vontade; que essa incapacidade seja notória ou conhecida do declaratário, não sendo exígivel a prova de qualquer prejuizo para o incapaz. Para que se verifique esta incapacidade, é necessário que, no momento em que é feita, o autor da delcaração se encontre, por doença ou qualquer outra causa acidental, em condições psíquicas que não lhe permitam entender e querer.
O Crime é um facto típico, ilícito, culposo e punível, seja praticado por acção ou por omissão. É acima de tudo um facto que se pratica quer por acção quer por omissão. O facto criminoso implica um desvalor face ao ordenamento jurídico. O desvalor traduz-se basicamente no facto de estarmos perante um comportamento contrário à ordem jurídica e que cria um dano aos valores e bens jurídicos essenciais à vida em sociedade. Os crimes são factos praticados que implicam um desvalor porque esse facto praticado implica um prejuízo sobre bens essenciais à sociedade. Estes actos implicam consequências jurídicas – as penas.
De acordo com o Código Penal, Artigo 144.º sobre a Ofensas à integridade física graves, é punido com pena de prisão de 2 a 10 anos, quem ofender o corpo ou a saúde de outra pessoa de forma a:
a) Privá-lo de importante orgão ou membro, ou a desfigurá-lo grave e permanentemente;
b) Tirar-lhe ou afectar-lhe, de maneira grave, a capacidade de trabalho, as capacidades intelectuais ou de procriação, ou a possibilidade de utilizar o corpo, os sentidos ou a linguagem;
c) Provocar-lhe doença particularmente dolorosa ou permanente, ou anomalia psíquica grave ou incurável; ou
d) Provocar-lhe perigo para a vida;
A aplicação das penas implica que o agente do crime pratique um acto culposo, ilícito, punível, e previsível. Independentemente da ilicitude do acto a conduta do agente tem de ser censurável por forma a que o agente seja considerado como consciente do acto que praticou e lhe seja aplicada a pena.
A pena é diferente das medidas de segurança porque na 1ª o agente tem de praticar um acto ilícito, culposo, típico enquanto que na 2ª basta que o agente pratique o acto típico e ilícito (sem culpa) (por isso é que há a inimputabilidade).

Conforme o estipulado no artigo 488º sobre a imputabilidade, no número 1 “ Não responde pelas consequências do facto danoso quem, no momento em que o facto ocorreu, estava, por qualquer causa, incapacitado de entender ou querer, salvo se o agente o colocou culposamente nesse estado, sendo este transitório”.

















Bibliografia:

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Constituição da República Portuguesa 2008 –Edições Almedina, SA ; Setembro de 2008

Código Civil 2008 – Edições Almedina; Maio 2008

Teoria Geral do Direito Civil – 3ª edição actualizada, Coimbra Editora; 1999